terça-feira, 30 de setembro de 2008

Entrevista com o palhaço Protocolo

O entrevistado dessa edição, se define como: "um amante de purê de batatas com feijão da Zezé, viciado em café e pão com ovo". Além disso, é palhaço, ator, artesão, produtor, professor, brincante do Boi Muleque Garboso e paralelo a tudo isso, ainda é marido, filho, irmão, padrinho e recentemente curtiu o seu primeiro dia dos pais. Estamos falando em outras palavras do palhaço Protocolo.
Com vocês: Ricardo Gadelha!


Guerrilha Aberta: Quando você começa a se dedicar a palhaçaria? E como nasce seu palhaço "Protocolo Sujis"?
Ricardo Gadelha: Meu trabalho como palhaço se inicia, e se fundamenta até hoje, a partir de saídas as ruas para improvisação e pesquisa em contato direto com o público. Em seguida, passei a procurar cursos e oficinas com mestres do riso, como : Marcio Libar, Leris Colombaione (Itália), Chacovachi (Argentina), Yeda Dantas, Palhaço Bicudo / Sergio Bustamante, Ana Luisa Cardoso, Itaércio Rocha, Mestre Zé de Vina (mamulengueiro).

O Sujis “nasceu” bem cedo, logo no início. Durante minhas saídas improvisava muito com os moradores de rua. O Sujis era aquele mindingo feliz que conseguia ver o lúdico no meio do desgaste da cidade. De uns tempos pra cá, o palhaço deu uma alinhada, a roupa ficou sem rasgos, a maquiagem mais clássica, passei a querer ter um produto, um número, um espetáculo ao invés de só improvisar livremente na rua. E passei a adotar o nome de Protocolo (que me foi dado por Yeda Dantas).


GA: Quando foi que você percebeu que seu palhaço era uma espécie de vagabundo que adora sujar lugares limpos para depois limpa-lo? Seria uma espécie de querer sempre se sentir útil no mundo? Ou alguma outra coisa?
Gadelha: Foi quando iniciei a montagem do meu número A Faxina. No início, tinha apenas uma brincadeira de deixar cair um objeto, e quando ia pegar este, deixava um outro cair. Uma gag clássica que vi o Bicudo fazendo no “Bicudo For Ever”, um espetáculo MUITO BOM deste palhaço-mímico-bufão-louco de pedra. Daí o Marcio (Libar) assistiu o número e orientou. Ele disse algo mais ou menos assim: “Isso, todo mundo já viu. Tu tem que fazer de um jeito que só você faria... E tem que pensar em cena. O público tem que acreditar que o palhaço está tentando acertar, tentando achar soluções, e não só deixando os objetos caírem”. Sou extremamente grato a ele por isso. Depois desse dia criei um monte de cascatinhas, gag´s e jogos com os objetos da Faxina (balde, vassoura, pá, espanador, lenço, burrifador de água) onde a lógica é arrumar, mas uma arrumação submetida a falta de inteligência e destreza próprias ao palhaço. O cara é super solícito, quer deixar tudo na maior ordem, mas sua debilidade cisma em prevalecer.


GA: Hoje, você já desenvolve um trabalho artístico em escolas públicas com crianças, além de ter feito parte da Cia de Mysterios e Novidades. Como você poderia dizer que se dá o desenvolvimento artístico no Brasil, mais especificadamente, no Rio de Janeiro? Até que o artista comece a viver do seu oficio?
Gadelha: Rapaz,....essa é a pergunta que a gente tem que responder todo dia, né? Hoje, “gracias a la vida, que me há dado tanto...”, posso dizer, orgulhoso, que vivo do meu ofício. O trabalho com educação é muito estimulante pra mim como uma forma reprocessar tudo que aprendi e que aprendo segundo meu ponto de vista, minha metodologia. É também uma oportunidade de experimentar o lugar do diretor, que me é extremamente novo e ao qual nunca busquei como artista, mas como professor de teatro, tenho sempre a demanda da famosa peça-de-fim-de-ano. Além de trazer uma remuneração mais fixa do que temporadas, espetáculos ou chapéu.

Como artista, acho que tem aquela fase em que a gente praticamente paga pra trabalhar. Tá começando, se junta com uma galera que pensa parecido, pesquisa, experimenta, se envolve em duzentas coisas ao mesmo tempo, quase não faz grana com o trabalho, mas ama e se sente teatreiro. Acho que é nessa fase que a gente descobre se fez a escolha certa. Aos poucos, das duzentas coisas diferentes que você faz, a pessoa vai focando naquelas que mais te realizam esteticamente. É sobre essas que tu passa a estudar, pesquisar, experimentar, buscar grupos, espetáculos, informações, etc. Ao mesmo tempo que tenta achar saídas de financiar sua vida e vender sua arte. E aí eu volto ao início desta resposta: é todo dia regando a plantinha. Buscando parcerias, patrocínios, escrevendo projetos, participando dos editais, trocando idéia com os grupos e cias que se sustentam, dando aula, trabalhando em trabalhos “normais”. Brecht já dizia: “Primeiro o estômago, depois a moral”. Acredito que assim, investindo no seu sonho artístico e na sua sustentabilidade como trabalhador de cultura o artista passa a viver de seu ofício (eu espero....).


GA: Há algum tempo atrás, numa das edições do Festival Internacional de Palhaços - Anjos do Picadeiro, rolou uma pergunta: "Bom palhaço já nasce feito?" E eu queria que você respondesse essa pergunta:
Gadelha:
Tem de tudo nessa vida. Eu acredito que sempre há por trás da história de um grande palhaço um intenso período de formação e treinamento, seja através da observação e transmissão de conhecimento entre gerações (família circenses tradicionais), ou por oficina e pesquisa prática e teórica, ou por outros meios, sei lá. Mas penso que a arte do riso exige uma precisão e disponibilidade que, acho eu, não é inata e sim, adquirida na labuta, no fazer. Chacovachi, que é um grande mestre palhaço de rua, diria que é uma questão de horas de vôo. Quanto mais a gente voa, melhor voa.


GA: O que é ser artista no Brasil?
Gadelha:
Eu resumiria em uma frase do Napão (Henrique Stroeter) do Parlapatões: - “Enquanto tiver bambu, flexa neles!”

Antes de acabar gostaria de fazer meu merchandaising... Pode? Lá vai:
Visitem meu site, na web: www.palhacogadelha.blogspot.com e contato para apresentações, troca de informações, etc: palhacoprotocolo@gmail.com .

Valeu Vinicius, parabéns aí pelo sucesso da Guerrilha, obrigado pelo convite, é uma honra colaborar para a promoção da arte popular e do ofício do palhaço. Disponha, viu?

Abração, Gadelha.

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