segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Entrevista com o cientista social e palhaço Matraca

Nesta edição, trouxemos uma entrevista com o cientista social, Marcus Campos, que desenvolve trabalhos na área da saúde. Nascido na cidade de Ipauçu interior de São Paulo, Marcus se auto-define como: "um espírito numa aventura humana, um mutante por natureza, sempre mudando a barba, o cabelo e o bigode", ou carinhosamente conhecido como Palhaço Matraca!


Guerrilha Aberta:. Como surge na sua vida o palhaço e quando nasce o palhaço Matraca?
Palhaço Matraca: Sempre gostei de palhaço, mas o interesse pela prática surge em 2000 no período que fiz o mestrado em saúde coletiva na Unicamp, onde tive a oportunidade de participar do projeto universidade solidaria. No processo seletivo as habilidades extra curriculares tinham mais peso que a formação acadêmica, a equipe se agregou neste espírito artístico com 22 pessoas rumo ao interior de Pernambuco na cidade de Jatobá. O coordenador da expedição, Dr. Celso Costa Lopes também era conhecido como Palhaço Juvenal e naquela terra distante as margens do Rio São Francisco, fui tocado pela Arte da Palhaçaria e pela prática da educação popular materializada no teatro de rua, no dialogo no centro de saúde, no trabalho com DST/AIDS em prostíbulos, nas rodas culturais, na alegria do povo na rua e no riso dos Índios Pankararus. Com estes, aprendi sobre os seres encantados e segundo o Pajé da tribo Seu Manézinho, estar vivo é estar encantado. Quando terminei o mestrado recebi uma proposta para trabalhar na gestão em recursos humanos da FIOCRUZ - Rio de Janeiro, chego na semana do carnaval de 2003 com o objetivo de me tornar Palhaço, mesmo ano que fiz a oficina A Nobre Arte do Palhaço ministrada pelo Palhaço Pobre Star Marcio Libar, e nunca mais parei. O compositor Batone do projeto LIXO EXTRAORDINARIO quem batizou o Palhaço de Matraca, acho que é por que falo pouco.


GA: Você além de palhaço é um cientista social, que desenvolve um trabalho com grupo de pessoas que muitas vezes são invisivéis na sociedade, relacionado a área de saúde e prevenção a doenças. As politicas públicas relacionadas ao setor são suficientes e funcionais?
Matraca: Faço doutorado em Ensino em Biociências e Saúde, na área de ensino não formal, na linha de ciência e arte no Instituto Oswaldo Cruz - Fundação Oswaldo Cruz. A Arte da Palhaçaria é uma ferramenta utilizada na investigação participativa, aqui compreendida como uma tecnologia social pró ativa na Promoção da Saúde e Alegria. A pesquisa não é voltada para a prevenção de doenças apenas, mas para a promoção da saúde, estratégia central do sistema única de saúde (SUS) para a melhoria da qualidade de vida da população. As condições de trabalho, de moradia, de alimentação, do meio ambiente, do lazer, da gestão participativa, das políticas públicas e da Alegria, determinam nossa maior ou menor saúde tanto individual, como coletivamente. Neste sentido as políticas públicas que temos atualmente não são suficientes e só podem ser consideradas eficazes se foram pensadas coletivamente com quem realmente participa. Mas se compararmos a 20 anos atrás quando nossa constituição foi formulada, andamos muito no que diz respeito a participação coletiva e popular, temos inúmeros projetos que não são divulgados e estão dando muito certo. Como a construção é coletiva e permanente temos que seguir em frente que atrás vem gente.




GA: E hoje em dia, você se considera mais palhaço ou cientista? Ou para você não tem diferença? Como é que os outros cientistas vêem a ciência sendo tratada com humor. Não deve ter muitos, não é? Teria algum caso para contar?

Matraca:
Se riso fosse algo só de palhaço, desde Aristóteles não teriam tantos pesquisadores investigando o tema. No ciência o campo é novo, mas cresce a cada ano com novos centros de pesquisa como o CASA (Ciência, Arte, Saúde e Alegria) do IOC/FIOCRUZ, que investigam temas relacionados neste campo. A ciência e a arte são campos distintos que dialogam mas intimamente que nos possamos imaginar, existem muitos cientistas que usam a arte no seu universo de trabalho e muitos artistas que utilizam da ciência. Sempre que vou em algum evento cientifico me apresento como Palhaço e veja as reações, depois digo que sou cientista. Eu me considero um pouco dos dois, sou Palhaço no meu dia a dia e um curioso por natureza, principio básico para se pensar ciência, e foi neste espírito que misturei os dois campos, não vejo dicotomia. Ser palhaço possibilitou vivenciar situações como esta: Era dia 10 de dezembro de 2004 – DIA DO PALHAÇO – E lá vai o Palhaço Matraca para a Av. Presidente Vargas, perto da estação Central do Brasil para celebrar seu dia. Falante como nunca o palhaço segue andante pela calçada até o cruzamento que favorecia a passagem dos automóveis tendo que esperar o sinal abrir. Quando olha ao seu lado avista uma jovem senhora com um sorriso singelo e gatuno como é, Matraca pois seus galanteios em ação, se apresentando e oferecendo seu braço para conduzir a transeunte a outra margem do sinal. Ela aceitou e relatou a seguinte história nos trinta segundo que se conta na imagem do homem verde do farol: Eu tive um filho palhaço, ele devia ter quase sua idade, era muito brincalhão e risonho como você, faz quase um ano que ele morreu. Chegando do outro lado da encruzilhada, nossos olhas se cruzaram e o palhaço falou para aquela fortaleza: É uma honra para meu ser poder trazer a lembrança do seu filho, mas os tempos são outros e apesar de tantos desencontros os encontros acontecem, como o nosso. Os dois se abraçaram, ela o abençoou e seguiram seus caminhos. Este é um exemplo dos diversos que vivo quando coloco o Palhaço Matraca para girar no mundo.


GA: Ainda falando sobre o povo invisível. Em 2006, você realizou um documentário, onde o palhaço Matraca ia com seu sax até os moradores de rua e profissionais do sexo, no bairro da Lapa. O que você tirou como melhor aprendizado desse trabalho? E quais foram os resultados alcançados dentro da área da ciência social?
Matraca: O Palhaço Matraca é personagem que desde 2003 transita em diversos territórios sociais promovendo saúde e alegria, registrados em dois vídeos documentários de cunho antropológico protagonizados por ele: Matraca e o povo invisível e Na Pista. Os dois vídeos fazem parte do projeto de doutorado “Alegria Para Saúde: A Arte da Palhaçaria como Proposta de Tecnologia Social no Sistema Único de Saúde”. Nesta investigação persigo a seguinte pergunta: A arte da palhaçaria tem poder dialógico para comunicar sobre questões de saúde com diferentes públicos? Após um longo trabalho de campo chego à conclusão que a Arte da Palhaçaria é uma tecnologia social com forte potencial dialógico, expresso nos documentários citados. Registramos diálogos vivenciados em que a prática da Palhaçaria subverte e promove uma divertida interação com a população de rua, com moradores e com profissionais do sexo. Sou saxsofonista e a musica é um dos eus cartões de visita, quando saco o instrumento posso promover uma Jam Session em qualquer lugar e situação, abrindo caminho para um conceito que desenvolvo denominado Dialogia do Riso. Ao final da tese, um dos resultados obtidos e que precisamos mais iniciativas voltadas para a promoção da alegria, e que os palhaços deste campo não fiquem apenas nos hospital, mas ocupem os centros de saúde para promovermos alegria nos diversos territórios. O riso é libertador, subverte e burla a ordem das coisas, para que o expectador adorne-se com a arte de rir da sua própria condição, transmutando assim sua realidade.





GA: O que é ser artista no Brasil?

Matraca: Creio que é ter a coragem de Dom Quixote e a ousadia de Macunaíma. Nossos artistas estão entre os melhores do mundo, precisamos nos unir e sair das nossas caixinhas para efetivamente compor política públicas que dialoguem com a educação, ciência e tecnologia, cultura e saúde.


GA: Alguma mensagem?
Matraca:
Saúde, Alegria e Prosperidade.


Visitem:
www.palhacomatraca.com.br

2 comentários:

Unknown disse...

O compositor Batone citado na resposta para a primeira questão foi meu professor de Arte-Educação!
Ele é ótimo!
Saudades de suas aulas... Pô!

Anônimo disse...

é por tudo isso que sou fã [só falta a carteirinha!] do Marcus e do Matraca! ;)